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17/10/2019

Corridas de rua transformam vida de jovem com autismo

corridas de rua

Eu fico muito feliz quando posso contar aqui exemplos de como o esporte transforma a vida de uma pessoa com TEA. Estive em um evento e conheci a Inez Sayuri Sataka, mãe de um jovem autista de 22 anos, que teve uma grande mudança de vida ao começar a praticar corridas de rua.

A história é tão bacana que resolvi aprofundar a conversa com a Inez e compartilhá-la aqui com vocês que acompanham o meu blog.

Rafael Tatsuya Sataka é um autista clássico não verbal, que teve seu diagnóstico fechado aos quatro anos, quando iniciou suas terapias no Hospital das Clínicas, em São Paulo.

Inez conta que voltava chorando de toda consulta, devido às conversas que tinha com outros pais. “Eles me contavam que a adolescência era a pior fase, porque as pessoas com autismo não sabiam lidar com os hormônios. Ficava apreensiva, pensando como seria quando o Rafael iniciasse esta fase”, lembra.

Dos quatro aos nove anos, Rafael tomou medicamentos para controlar a hiperatividade, melhorar a concentração e o sono e reduzir as crises. Porém, eles causavam efeitos colaterais sérios. O menino batia a cabeça na parede, gritava e até teve convulsões.

“Creio que não existe remédio específico para o autismo. Eles servem para esquizofrenia, Alzheimer. Pessoas com síndrome do pânico tomavam o mesmo medicamento que o meu filho. Refletimos bastante e, depois de momentos de muito desespero, eu, minha filha e meu marido decidimos suspender as medicações e assumir as responsabilidades”, revela.

Aos 10 anos, Inez tirou Rafael da escola e passou a educá-lo pela ciência ABA e nos princípios da Terapia da Vida Cotidiana. A proposta era ensiná-lo a entender comandos e a ter mais autonomia para se vestir, se servir, comer sozinho e tomar banho.

LEIA MAIS: Medalhas e troféus no ciclismo marcam a vida de autista de 36 anos

A chegada da puberdade e a prática das corridas de rua

rafael tatsuya sataka

Quando Rafael completou 13 anos, entrou na puberdade. Inicialmente, descobriu a ereção e acabou se assustando, pois foi algo involuntário e ele não entendia muito bem o que estava acontecendo com o seu corpo. Neste momento Inez precisou intervir e orientar, para que o filho entendesse que existia hora e lugar para esta prática, de forma a melhorar seu convívio social.

Inez reuniu a família para uma conversa sobre o assunto e todos chegaram à conclusão de que a atividade física seria uma boa opção para Rafael gastar energia, até porque ele já era adolescente e seria uma forma interessante de ocupar o tempo dele.

Entretanto, encontrar um professor de Educação Física disposto a trabalhar com Rafael foi desafiador. Vários profissionais negaram, alegando que nunca haviam trabalhado com adolescentes autistas, que não tinham especialização em educação especial e que não sabiam como atuar ou que resultados obteriam.

Até que um professor aceitou.

Progressos, desafios e conquistas

inez rafael tatsuya

O profissional de Educação Física trabalhou com Rafael durante três anos, e a família só viu benefícios. Ele começou a se desenvolver, a correr, a melhorar a postura e a coordenação e a controlar as emoções.

Victor Hugo, pai de Rafael, pensou que o professor poderia incentivar seu filho a praticar corridas de rua, de 5 quilômetros.

Os treinos começaram e Rafael treinava em um parque com o professor. Esse processo foi muito importante para desenvolver ainda mais o adolescente.

Com um segundo professor, que também era corredor, os progressos só continuaram. “Como apliquei a ABA, meu filho era capaz de entender todos os comandos, o que facilitou bastante o trabalho do novo professor, que está conosco há quatro anos”.

Nos primeiros treinos, Inez acompanhou tudo de perto, até para que o professor pudesse receber orientações e conhecer melhor o Rafael.

Há três anos, o jovem autista fez a primeira corrida de rua de 5k. Depois, fez a segunda no Autódromo de Interlagos, em São Paulo, e na terceira, uma surpresa: o professor sugeriu que Inez corresse junto com Rafael. Dessa forma, ele poderia treinar mais dias na semana e correr distâncias maiores.

“Como o professor não teria disponibilidade para estar presente em todas as corridas, me incentivou a participar com meu filho. Nunca havia corrido. Então, comecei a treinar e, na terceira corrida de rua de Rafael, eu participei com ele”, conta a mãe.

meia maratona

Em setembro de 2019 Rafael e Inez traçaram um novo desafio: a Meia de Sampa, de 21k.  E bota desafio nisso! “Meu filho sofreu uma entorse perto do tornozelo duas semanas antes da corrida. Imobilizou até o joelho e tomou remédios. Como ele não treinou depois disso, eu já havia colocado na cabeça que a gente não ia mais correr”, conta a mãe. “Mas ele estava ansioso demais e para todo mundo repetia ecolalias: ‘corrida, medalha’ e ‘tá sarando, tá sarando’. Cheguei à conclusão de que ou a gente corria assim mesmo ou não corria ninguém. E sabia que se a gente não fosse ele ficaria muito frustrado.”

Então decidiram ir. Inez conta que ela estava ansiosa, mas que que Rafael estava muito mais. A satisfação de estar ali não cabia dentro dele. “Ele não tem noção de quilômetros, por isso coloquei na cabeça dele que era longe e que seria necessário correr muito para conseguir a medalha.”

Eu tentei reproduzir o relato da Inez aqui, mas o áudio dela me contando detalhes da corrida é tão bonito e emocionante que eu preciso compartilhar com vocês:

 

Equoterapia e pintura: outras habilidades em desenvolvimento

pintura e equoterapia

Além da corrida, Rafael também pratica equoterapia há 13 anos e participa de torneios três tambores. Como atleta paraequestre, também coleciona troféus.

E, há cinco anos, a pintura com tinta óleo entrou na vida de Rafael. “Como meu filho apresentava dificuldades de coordenação motora e não sabia segurar o lápis, eu dava muita pintura para ele. E percebi que ele gostava muito. Comecei pintura com lápis de cor, em 2006, e depois passei para o guache. Como ele adorava o Pokemon, escolhia os desenhos e eu imprimia os desenhos ampliados em papel madeira para ele se entreter e se desenvolver”, explica Inez.

De repente, Rafael começou a misturar cores e tons. Aí os pais perceberam que ele poderia ir além e precisava de orientação profissional.

Em 2016, participou de um bazar com 30 quadros. E, em setembro de 2019, expôs cerca de 60 telas pintadas com tinta óleo.

LEIA TAMBÉM: Como é crescer com autismo?

Autismo com amor e sem remédios

autismo com amor e sem remédios

Inez comemora o desenvolvimento do filho e credita os ganhos à prática de esportes. “Tanto as corridas de rua quanto a equoterapia só trouxeram benefícios. Sobre a parte fisiológica, eu acho que, pelo fato de meu filho estar sempre cansado, devido às atividades, ele dorme a noite toda e se levanta tranquilo”.

Autismo com amor e sem remédios é a bandeira que toda a família de Rafael levanta e compartilha com outras famílias. O jovem hoje não depende de medicações e vive feliz e saudável. “Minha opinião como mãe é que o esporte é um dos melhores remédios para crianças com autismo”, afirma Inez. Acompanhe as história do Rafael também pelo Facebook.

Linda esta história do Rafael, não é verdade? Caso haja algum assunto relacionado ao autismo que você tenha dúvidas, use o espaço dos comentários para deixar sua sugestão. E fique à vontade para compartilhar nossos materiais nas redes sociais!

Para ver nossos outros artigos, clique aqui.

4 Comments on “Corridas de rua transformam vida de jovem com autismo

EDMILSON SILVA FIGUEIREDO
17/10/2019 em 14:02

Muito bom a matéria.
Me formei este ano e cheio de expectativa pra trabalhar nesta área.

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Tiago Toledo
12/06/2020 em 11:38

É uma excelente área para atuar, boa sorte 💪

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Clessia Paulino
20/10/2019 em 14:12

Achei legal essa matéria, pois tenho filhos com autismo , eles não tomar remédio algum . Estuda em escola circula é fácil de se comunicar com outras pessoas, mais para chegar a onde eles estão abrir mão de muita coisa em minha vida, para eles alcançarem o patamar em que eles estão hoje,não foi fácil mais estamos vivendo dias de conquistar para Glória de Deus, as aulas de educação física ajuda bastante a integração social desses alunos tão especiais . É difícil a caminhada mais não impossível. A música é um das coisas que me ajudou muito, fiz e faço o esforço para que evoluam para contribuição do seu desenvolvimento.

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Tiago Toledo
12/06/2020 em 11:40

Clessia, muito obrigado por ter compartilhado a sua história com a gente, realmente a educação física quando é ministrada por profissionais capacitados, tem um enorme impacto no social, cognitivo e nas habilidades motoras dos alunos.

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